Trauma vicariante

Por Danielle Krizanovski e Fabiana K. Altman

O conceito de trauma vicariante é novo na Psicologia e poucas pessoas ouvem falar sobre isso. As concepções de trauma comuns são relacionadas às vivências e lembranças pessoais de exposições e situações de medo e ativação do sistema de emergência do corpo. No caso de um trauma vicariante, alguém que nunca vivenciou a situação traumática sente o trauma. Mas como isso é possível?

‘Vicário’ significa ‘o que substitui’, ou seja, trata-se de um trauma que substitui o lugar de alguém, indireto, como se estivesse vivenciando aquela experiência apesar de nunca tê-la vivido. Por exemplo, o caso de muitos profissionais da área da saúde, expostos à escuta e à vivência de experiências traumáticas muitas vezes ao dia e vários dias na semana ao decorrer de muitos anos. Caso não tenham uma grande autopercepção nem um trabalho terapêutico de apoio, não conseguem desvencilhar o que é o relato do paciente do que é sua própria vivência, de modo que seus sistemas nervoso compreendem que aquilo que ouviu virou um trauma próprio.

Com o avanço da tecnologia, podemos acompanhar em tempo real o que está acontecendo em qualquer lugar do mundo a qualquer momento. Enquanto isso é bom por podermos estar sempre informados e conseguimos enviar ajuda e mantimentos quando possível, também vemos pessoas chorando pela perda de familiares ou amigos. Como ficamos vendo caixões, cidades inteiras devastadas por tsunamis ou vítimas de guerra? Como é possível vermos tudo isso e, ainda assim, permanecermos alheios ao que está acontecendo?

O trauma vicariante é esse trauma sofrido por empatia. Não pelo que vivemos, mas pelo que vemos e ouvimos. Choramos junto às crianças mortas na escola da cidade do Rio de Janeiro, com o incêndio na Boate Kiss em Santa Maria que matou inúmeras pessoas, com o que ocorreu em Mariana e em Brumadinho, com os ataques terroristas que acontecem ao redor do mundo.

E, nesse ano de 2020, o mundo parou. Ouvimos notícias sobre um vírus desconhecido com alta taxa de transmissibilidade matando milhares de pessoas que foi se espalhando pelo globo até bater em nossa porta. Ouvimos os mais variados relatos, presenciamos cidades vazias devido ao decreto de isolamento social, vimos pessoas perdendo seus empregos e não tendo o que comer, além de perderem entes queridos.

Os médicos que atendem pacientes em uma pandemia sabem que vão intubá-los conscientes e sem se despedirem da família? Como eles ficam após horas, dias, semanas, meses passando cotidianamente por cenas semelhantes? Presenciando pessoas morrerem, temendo serem contaminados e infectar as pessoas que amam, e trabalhando horas extras para cobrir o colega que se contaminou? Aguardando, com medo, pela sua vez de ser contaminado? Será que existe alguma maneira de vivenciar todas essas circunstâncias atípicas E não ser contagiado por todos esses traumas recorrentes?

Nesses casos, é possível pensar em medidas preventivas a serem adotadas, como evitar assistir ou ouvir ao noticiário toda hora, buscar separar sua vida profissional da pessoal, ter momentos de lazer e relaxamento, e procurar atendimentos de psicoterapia ao vislumbrar os primeiros sintomas traumáticos ou de esgotamento físico e mental. Mas ressaltamos a importância de realizar acompanhamentos psicológicos e medicamentosos, se necessário, com profissionais especializados com experiência no manejo de traumas a fim de ser acolhido(e) e beneficiado com as melhores estratégias para se recuperar de forma rápida e eficácia.

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