Por Daniele Rodrigues
Cirurgia bariátrica, remédios para inibir apetite e dietas são algumas medidas para combater a obesidade, mas o mais importante é entender a complexidade que envolve esse tema e o papel da comida na constituição psíquica e afetiva da pessoa obesa. E uma alternativa substancial é focar nos eventos traumáticos e na relação com a comida, principalmente em tais circunstâncias.
É bastante comum desenvolver obesidade após experiências traumáticas, sendo geralmente acompanhada de depressão e uma profunda melancolia. A partir de uma desregulação somática, o organismo mantém-se em um constante estado de alerta, alterando a produção de hormônios e mantendo elevado o nível de cortisol. E, para se autorregular, o indivíduo busca por prazer nas mais diferentes formas, sendo culturalmente a mais aceita através da alimentação.
Não é raro presenciarmos o oferecimento de comida em situações tristes e de tensão. A comida é utilizada em celebrações, confraternizações e recompensas, e nosso cérebro já está condicionado a isso; além de cultural, também é fisiológico, e a estimulação familiar torna esse hábito ainda mais natural. Tomemos por exemplo o ‘mamá’, o pirulito, até o pedaço de bolo feito pela vovó oferecido à criança para distraí-la e evitar crises de choro, algo frequentemente estimulado desde a infância. Por esse motivo, a comida passa a ter uma relação afetiva, fortalecendo o ciclo da compulsão alimentar e da fome emocional. E ah, como o açúcar dá prazer, não é mesmo?
Evidentemente, o sedentarismo e os maus hábitos interferem negativamente no quadro clínico; porém, estes são apenas a ponta do iceberg. O universo da obesidade é vasto e complexo, e justamente por essa razão é tão comum ocorrer reganho de peso mesmo após a realização de procedimentos cirúrgicos.
Se não olhar com atenção os seus aspectos emocionais, principalmente os eventos traumáticos vivenciados no passado, o indivíduo dificilmente terá sucesso em emagrecer definitivamente. Ter um corpo leve não requer apenas autocontrole alimentar e praticar atividade física, mas também uma vida leve propriamente dita. Deixar no passado os problemas do passado é vital para aprender a olhar a vida de outra forma, e isso somente é possível através de um verdadeiro processo de cura em setting terapêutico, ao invés de ignorar os problemas e nunca mais tornar a observá-los sob o falso pretexto de ‘ter superado e deixado tal assunto no passado’.
Sendo assim, a cirurgia bariátrica é muito complexa. Não basta apenas operar o estômago e intestino para se obter o corpo tão sonhado. Sem dúvidas, a cirurgia levará ao emagrecimento e durante aproximadamente dois anos seu corpo perderá peso até mesmo dormindo, sem grandes esforços, o que costuma gerar grandes alegrias ao recém operado. Entretanto, após esse período, o organismo entra numa homeostase e a perda de peso torna-se mais sutil, mais lenta, exigindo uma conduta saudável e condizente ao procedimento realizado. Por esse motivo, torna-se necessário revisitar toda a orientação inicial na etapa preparatória, que muitas vezes acaba sendo ignorada.
Em geral, a compulsão é marcada por feridas emocionais profundas que não são curadas pela cirurgia. E embora o procedimento favoreça o emagrecimento, a manutenção do peso magro decorre das escolhas conscientes realizadas em todas as áreas da vida, reforçando a importância de controlar os fatores ambientais que levam aos maus hábitos alimentares e estilo de vida. Ou seja, olhar com atenção para as dores emocionais que influenciam no comportamento compulsivo.
Outro motivo pela qual a opção pela realização da bariátrica deve ser muito bem pensada é por envolver demasiadamente fatores afetivos e emocionais que influenciam diretamente no pré e pós operatório. Infelizmente não haverá sucesso na operação e na manutenção do peso saudável se não olhar cuidadosa e responsavelmente para si, trabalhando tudo o que for necessário, pois é uma decisão que requer comprometimento e respeito consigo mesmo. A caminhada é conjunta, mas muito mais que profissionais habilitados com essa prática clínica, é necessário a consciência de que 50% do sucesso obtido é do próprio paciente.
E, nesse caso, a maioria das complicações no pós-operatório imediato não é consequência de má conduta médica, como muitos pensam, mas de mal comportamento do próprio paciente. Nesse cenário, a ansiedade costuma ser a principal vilã.
Portanto, não se preocupe em atrasar a linha de partida; o mais importante é não tropeçar pelo percurso e, caso aconteça, não se desesperar. O atraso na largada faz com que os passos sejam mais lentos, mas mais firmes e consistentes para uma chegada perfeita, na melhor performance de sua forma física, mental e emocional.