Por Gabrielle E. R. Gomes
A morte é um tema carregado de medo e tabu, mesmo na cultura oriental. A ideia de finitude, a negação da partida de um amigo ou familiar com quem se tinha muito apreço e até mesmo a incerteza do que seguirá alimentam ansiedades profundas em muitas pessoas. É um tópico frequentemente evitado e considerado sombrio, e apesar da reverência em rituais complexos no Oriente, lá também há restrições sobre como e quando a morte é discutida.
Esses tabus refletem profundamente como as diferentes sociedades lidam com a perda, o luto e a memória dos que se foram, e não é diferente quando aplicada ao tarô. Os medos coletivos são traduzidos em interpretações errôneas da carta, que por sua vez também carrega diversos estigmas de negatividade.
Não é incomum, por exemplo, que um consulente julgue à primeira vista como um ‘sinal do universo’ para perdas iminentes ou desgraças e imediatamente se sinta apreensivo pelo nome e imagem que se apresenta diante de si, permanecendo ‘na defensiva’. Há até mesmo quem possa reagir com certo pânico e rejeição, dependendo do seu grau de ansiedade e do contexto que vive no momento da tiragem.
Na realidade, quando são reveladas outras cartas com figuras negativas, é compreensível supor que sua vida seguirá de mal a pior ou sofrerá um revés inevitável. Mas a verdadeira simbologia da carta está muito aquém de um mau presságio, e é aí onde se encontra o objetivo deste artigo. Aqui será explorada sua verdadeira essência, com ênfase na aceitação das mudanças e da ciclicidade da vida como uma ferramenta para não somente melhor compreender seu cenário, quando se sente ‘no olho do furacão’ e exausto(a), mas também em colaboração para o entendimento das suas dores e dificuldades, favorecendo o processo de cura com mais leveza e ludicidade em conjunto com psicólogos e outras técnicas terapêuticas, trabalhando de modo multidisciplinar.
Assim sendo, este artigo se inicia informando que a carta da Morte é a décima terceira carta do tarô, retratada por uma figura esquelética sob um cavalo imperioso em uma paisagem desolada, que simboliza a inevitabilidade da morte física. Ela veste roupas pretas e armaduras de guerra, e carrega consigo uma bandeira de guerra enquanto outros seres estão caídos ao seu redor, ajoelhados, misericordiosos, implorando e aceitando seu destino com correntes presas ao pescoço. Alguns baralhos ainda mostram clérigos e rios fluindo ao fundo, simbolizando a bênção da travessia para um novo ciclo e a passagem do tempo.
Embora um tanto quanto dramático, em um contexto mais profundo e simbólico, trata-se da inevitabilidade de um processo de transformação, uma declaração de que para algo novo surgir é preciso deixar o antigo para trás e não há mais como procrastinar. Por isso, a carta reforça a importância da aceitação dessa condição e da impermanência na zona de conforto, apesar da resistência inicial natural nessas ocasiões.
Essa carta pode ser vista em tiragens para inúmeros contextos, como, por exemplo, para um casal co-dependente cuja esposa-mãe é continuamente sobrecarregada pelo marido ausente e distante. A dinâmica dessa relação inevitavelmente gera tensão e desconforto, revelando a necessidade de mudanças decisivas para maior redistribuição das responsabilidades, colaboração em diversos âmbitos da relação e bem-estar à família. Dependendo das cartas auxiliares (ou seja, daquelas que foram abertas ao redor), é possível constatar a ocorrência de diálogos profundos e significativos que resultarão em compreensão e maior cooperação, em direção ao reequilíbrio e cura gradativa das disfuncionalidades. Ou, no pior dos cenários, corresponder à constante postergação e descompromisso do rapaz para com sua família, resultando no término iminente do casamento.
O mesmo pode ser dito para uma fisioterapeuta que busca o desligamento do seu emprego em um hospital de renome na cidade para finalmente empreender em seu grande sonho de abrir uma clínica referência em atendimentos multidisciplinares para a saúde e estética, voltada principalmente ao público feminino. Embora sua ocorrência frequentemente se dê em eventos marcantes, essa carta oferece uma mensagem de esperança, um convite para aceitar a natureza cíclica da vida e reconhecer que a mudança é uma constante inevitável. E, embora seja doloroso ou desafiador, é igualmente necessário para o desenvolvimento de autoconhecimento e maturidade emocional.
Estes exemplos intuem a seguinte reflexão: a Morte é um encorajamento a aprender a desapegar do falso senso de segurança e identidade frequentemente atribuído a pessoas, objetos, situações ou crenças, e deixar a vida fluir em novas possibilidades e ciclos. Trazer à consciência o que causa esse apego é o primeiro passo para a aceitação da impermanência, especialmente importante para a cura e processo de transformação.