Por Ceres Canali
Você sabia que, nestes trinta e três anos de consultório trabalhando com casais, cheguei à seguinte constatação: embora os casais frequentemente reconheçam a importância das relações afetivo-sexuais, muitas vezes negligenciam essa área?
As prioridades recaem sobre si mesmos, os papéis parentais e profissionais, deixando a relação conjugal em segundo plano. Em meio ao estresse, cansaço, falta de tempo, atenção e carinho, a vida sexual do casal na atualidade torna-se rápida e monótona, frequentemente relegada ao último compromisso do dia, quando as energias já foram exauridas pelas demais obrigações. O ato sexual, que deveria ocorrer de maneira espontânea e desejada, transforma-se em mais uma obrigação ditada pela rotina, focada no desempenho sexual.
Entretanto, o sexo deve ser uma expressão de desejo, lazer, prazer, reprodução, afeto, aconchego e orgasmo. Quando algo é genuinamente apreciado, não é necessário seguir uma frequência ou forma pré-determinada; o ato acontece porque é desejado, não como mais uma tarefa a cumprir no cotidiano.
O conceito de habituação sexual é relevante para explicar como a repetição de um mesmo padrão de interação sexual pode levar à diminuição do interesse e prazer ao longo do tempo. Casais que vivem uma vida sexual rotineira, mecânica e desprovida de variação, onde tudo ocorre sempre da mesma maneira – no mesmo horário, quando ambos já estão cansados e prontos para dormir – acabam experienciando essa habituação. Estão na cama, frequentemente assistindo televisão ou respondendo a mensagens no celular, e seguem uma sequência previsível de atos, sem espontaneidade. Muitos relatam até mesmo uma certa preguiça de iniciar o ato sexual, preferindo adiá-lo.
Casais que se encontram presos na rotina diária, ao retornar para casa e repetirem comportamentos previsíveis – ele assistindo TV, enquanto ela cuida das refeições – frequentemente perdem a conexão emocional. Muitas vezes, o jantar é marcado pela ausência de integração real, com ela ocupada no celular e ele focado na televisão. Tudo ocorre de maneira mecânica, sem espaço para brincadeiras, encontros íntimos, sensualidade, atenção, carinho e proximidade emocional.
Ainda que a estabilidade da rotina possa oferecer conforto, ela pode facilmente tornar-se monótona. O ser humano necessita de variação, pois a monotonia tende a reduzir o interesse, mesmo as experiências mais agradáveis, como uma música favorita ou uma refeição deliciosa, quando repetidas incessantemente, perdem o encanto. Não é raro que casais relatem um aumento no desejo sexual durante os períodos de férias. Ao investigar o que mudou, percebe-se que a alteração da rotina trouxe descanso, descontração, um novo ambiente e tempo disponível para explorar a sensualidade e novas possibilidades eróticas, sem a pressão das obrigações diárias.
Muitas vezes, a preocupação e a culpa por dedicar menos tempo e atenção aos filhos são tão intensas que o casal não se permite, mesmo que esporadicamente, um fim de semana sem a presença das crianças – um momento dedicado exclusivamente ao relacionamento conjugal. No entanto, é crucial reconhecer que, se o casal não estiver em harmonia, os próprios filhos serão os mais afetados pelas consequências.
Portanto, uma gestão equilibrada do tempo é essencial para conciliar as diversas obrigações com as oportunidades para desfrutar do prazer em família e na relação a dois. O cuidado com o relacionamento conjugal, a promoção de encontros afetivos, momentos de lazer, brincadeiras, sensualidade, erotismo e a vida sexual são elementos fundamentais para manter a chama do relacionamento acesa e combater a habituação sexual.